Futebol Nacional

100 anos de Barbosa, um ídolo maior do que qualquer gol já sofrido

Moacir Barbosa Nascimento, ou apenas Barbosa, é conhecido como um goleiro ídolo do Vasco da Gama e um dos maiores guarda-redes do futebol brasileiro. Embora tenha sido um grande “arqueiro”, foi punido injustamente pelo segundo gol uruguaio, que tirou o título mundial do Brasil, causando o chamado “Maracanazo”. 


Ganha Julio Pérez, que entregou imediatamente para Míguez, Míguez devolveu para Julio Pérez, que está lutando contra Jair, ainda dentro do campo uruguaio dá para Ghiggia, Ghiggia devolveu para Julio Pérez que encontrou em profundidade o ponteiro direito, corre Ghiggia, aproxima-se do gol do Brasil e atira… Gol do Uruguai!

O gol do “Maracanazo” (Créditos: Agência EFE)

Assim relatou o narrador Jorge Curi, da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, que teve o difícil trabalho de descrever o gol do título uruguaio. Porém, tanto naquele dia 16 de julho de 1950, quanto para toda a vida, Jorge Curi não seria vítima de tantas críticas quanto um jogador.

MARACANAZO E REFLEXOS NA VIDA DE MOACIR:

“No Brasil, a pena máxima (de prisão) é de 30 anos, mas pago há 40 por um crime que não cometi” – Assim relatou Barbosa, em uma das frases mais históricas no futebol brasileiro.

Após o duro vice-campeonato em um Maracanã com 200 mil pessoas, Barbosa foi injustamente caçado pela sociedade brasileira, como o grande culpado na final. Durante sua vida, Seu Moacir constantemente citou o tratamento, que em muitas vezes, recebeu por parte do povo e da mídia. Sobretudo, um dos mais marcantes se tratou de uma mãe que o identificou ao seu filho como “o homem que fez o Brasil chorar”.

Após a derrota na final, surgiram teorias por todo o país sobre uma possível “má sorte”, que teria comprometido o elenco brasileiro, devido à cor de pele do goleiro. Coincidência ou não, apenas em 2006 a seleção brasileira possuiu um goleiro negro titular em uma Copa do Mundo, sendo Dida o encarregado na proteção. Por último, o Mundial de 2014 teve Jefferson como o último representante, mas o ídolo botafoguense foi reserva na competição.

O INÍCIO DA CARREIRA:

Nascido em 1921, na cidade de Campinas, Moacir Barbosa era um goleiro de muito talento, sendo reconhecido por muitos, por suas defesas plásticas e seu nulo medo de saltar nos pés dos atacantes. Embora tenha sido um grande goleiro, Moacir começou como ponta-esquerda no Comercial, sendo transferido para o Ypiranga (SP) como goleiro. Devido suas atuações no clube paulista, o Vasco contratou Barbosa no ano de 1945.

Apesar de sua contratação, Barbosa amargurou sua primeira temporada na reserva, e contou com a sorte de seu companheiro, para virar uma lenda no Vasco.

GOLEIRO RODRIGUES, SORTE E A GRANDE OPORTUNIDADE DA VIDA:

No ano de 1945, Gabriel Rodrigues, goleiro de 30 anos, acabava de ser contratado ao Gigante da Colina junto ao Comercial, virando titular da equipe no Campeonato Carioca. Obtendo boa estatura e qualidade nos reflexos, Rodrigues foi peça chave no elenco vascaíno, conquistando o título carioca de 1945 invicto.

Goleiro Rodrigues e o time campeão carioca invicto (Créditos: Arquivo O Globo)

Ainda que toda sua qualidade tenha sido fundamental ao Vasco, Rodrigues não continuou no clube, deixando até mesmo o futebol. O motivo? Simples. No mês seguinte ao título, Gabriel se encontrava de férias, em Caxambu, quando decidiu comprar uma antiga loteria de aposta. Embora não esperasse que sua sorte estivesse tão alta, Rodrigues venceu o prêmio de 200 mil cruzeiros, uma fortuna na época, que garantiu uma “vida ganha”, decidindo se aposentar do futebol e deixando a vaga para o jovem Barbosa.

ENFIM, A IDOLATRIA:

Devido a saída de Rodrigues, Barbosa finalmente assumiu o gol de São Januário, no qual defendeu por 10 anos seguidos. Com isso, o arqueiro disputou 485 partidas pelo cruzmaltino, sendo um dos protagonistas de um dos maiores esquadrões do futebol brasileiro, o Expresso da Vitória.

Durante seu período no Vasco, Barbosa conquistou um total de 14 títulos, tendo como destaque as seis glórias no Campeonato Carioca, e sem dúvidas, o grande Campeonato Sul-Americano de Campeões de 1948, torneio percursor da Libertadores e inspirador da Champions League.

Por fim, Barbosa foi indubitavelmente o melhor jogador da partida decisiva ante o River Plate, pelo Torneio Sul-Americano. O ídolo vascaíno é conhecido por parar um ataque com Labruna, Di Stéfanno e Loustau.

Barbosa, goleiro ídolo do Vasco, em uma final contra o River
Barbosa atuando na partida final, contra o River Plate (Créditos: Acervo River Plate)

LESÃO GRAVE E DEPRESSÃO:

No ano de 1953, em uma partida entre Vasco e Botafogo, Moacir teve sua perna quebrada num choque com o atacante Zezinho, se ausentando dos gramados e da seleção. Devido sua contusão, o goleiro repensou sua carreira, se inclinando a se aposentar. Em virtude da grave lesão, Barbosa só se recuperaria depois de quase 1 ano e alguns tormentos. Após passar meses no hospital, o arqueiro desenvolveu uma depressão, que só seria curada depois de uma grande mobilização das torcidas, fazendo fila para visitar seu ídolo.

Posteriormente ao carinho dos fãs, Barbosa decidiu voltar aos gramados, passando por cima até de sua família, que era contra seu retorno. Sendo assim, o goleiro voltou a ser titular, mas devido a lesão, sua habilidade foi comprometida, fazendo o goleiro deixar o Vasco rumo ao Santa Cruz.

DE VOLTA PARA CASA:

Após duas temporadas em Recife, Barbosa foi emprestado ao Bonsucesso, impressionando o Vasco, que logo se interessou e contratou o jogador. Em sua volta a casa, Moacir ainda conquistou seu último Campeonato Carioca (1958), e defendeu seu clube de coração até 1962. Posteriormente aos últimos 4 anos no cruzmaltino, Barbosa foi ao Campo Grande encerrar sua carreira.

APOSENTADORIA:

Por fim, jogando no Campo Grande, Moacir encerrou sua vida futebolística de maneira melancólica. Atuando no dia 8 de julho, em Conselheiro Galvão, Barbosa se aposentou após sentir a coxa, logo depois de saltar de um pênalti defendido no ângulo.

Barbosa saiu pela última vez nos gramados, aos 38 minutos do primeiro tempo. “Andando pela pista, em direção ao vestiário, Barbosa tinha lágrimas nos olhos, estava de cabeça baixa e recebia estrondosa ovação do público, de pé”. O ex-goleiro do Vasco sofreu uma distensão da virilha direita, informou no vestiário o médico Oscar Santamaria, que saiu abraçado ao goleiro.

Curiosidade: A data de seu último jogo remete ao mesmo dia do “7-1”.

O FIM:

Barbosa, goleiro ídolo do Vasco
Barbosa, ídolo máximo no gol vascaíno (Foto: AcervoUh/ Folhapress)

Após sua aposentadoria, Barbosa deixou seu legado com Tereza Borba, sua filha de consideração e cuidadora de idosos. Devido muitas cobranças, Seu Moacir deixou o Rio direto para cidade de Praia Grande.

Em 1997, sua querida esposa, Clotilde, faleceu devido a um câncer de medula. Logo depois do falecimento de sua esposa, Barbosa sofreu com dificuldades financeiras, não conseguindo manter sua moradia, que acabou sendo vendida. Após vir tal fato vir a público, Moacir viveu com ajuda financeira de amigos e do Vasco, que lhe enviava dinheiro para pagar seus aluguéis.

Embora enfrentasse dificuldades, Barbosa teve Tereza Borba como sua grande protetora, sendo casada com um vascaíno fanático, que ajudou a unir o elo entre o ex-goleiro e a cuidadora de idosos. Em seus últimos dias de felicidade, Tereza conta ter fechado seu antigo quiosque para uma comemoração do aniversário do ídolo vascaíno.

Por fim, neste mesmo dia, Tereza deu ao Barbosa, um bolo confeccionado com o escudo do Vasco e um troféu escrito “para o herói da minha vida”. Sendo assim, Tereza afirma em entrevista que o ex-goleiro disse, entre os amigos presentes, que se falecesse neste mesmo dia, faleceria feliz.

Moacir Barbosa Nascimento faleceu no dia 7 de Abril de 2000, apenas onze dias após seu grande dia de felicidade. Apesar de todas as críticas injustas ao maior goleiro da história do Vasco, Barbosa viveu, foi vitorioso, venceu as injustiças e faleceu feliz.

Tiago Emanuel

Jornalista em progressão e amante do futebol passional.
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