Salma al-Majid. Crédito: ASHRAF SHAZLY /AFP
Futebol, Futebol Feminino, Futebol Internacional

Salma al-Majidi: a primeira mulher a treinar um time masculino em pleno Oriente Médio

A primeira mulher a treinar um time masculino no mundo árabe teve que enfrentar muita coisa em seu caminho. Por isso, Salma al-Majidi aparece na lista da BBC entre as 100 mulheres mais inspiradoras de 2015.

O mundo árabe é sem dúvidas um lugar nada cordial para as mulheres. Em maior e menor escala, alguns países até conseguem manter algum tipo de cordialidade, mas longe do ideal. Quando falamos de uma treinadora comandando um time masculino, isso ainda parece inviável, mas está acontecendo.
 
Salma al-Majidi, aos 25 anos, foi reconhecida pela FIFA como a primeira treinadora de futebol masculino no mundo árabe. Sua carreira começou no Al-Ahly Al-Gadaref, do Sudão, seu país de origem. Depois, teve passagens pelo Al Nasr, Al Nahda, Nile Halfa e Al Mourada. Times das mais diferentes regiões do oriente, como Emirados Árabes e Arábia Saudita.
 
O Sudão, onde nasceu, é um país um pouco mais ponderado em relação a outros como a Arábia Saudita. Entretanto, a prática de esporte por mulheres ainda é vista como um ato imoral, ainda que não proibido, não existe futebol feminino no Sudão. Por isso, Salma escolheu percorrer um caminho diferente do habitual.

Quem é Salma al-Majidi?

Salma em um de seus treinamentos. Crédito: AFP
Salma em um de seus treinamentos. Crédito: AFP
 
Filha de um policial aposentado, Salma al-Majidi estudou contabilidade e administração na faculdade Al Nasr Technical. Porém, se apaixonou pelo futebol já aos 16 anos, quando pôde acompanhar os treinamentos de seu irmão na escola. Observando atentamente os gestos e os ensinamentos do treinador, ela foi de fato pegando gosto pela ideia de fazer parte de um time, mas infelizmente, sabendo que não existe equipe feminina no Sudão, ela tentou entrar para uma equipe de futebol masculino.
 
Vendo que ela levava jeito para o esporte, o treinador aceitou trabalhar com a menina, que mais na frente, acabou comandando os seus próprios times em categorias de base, como o Sub-13 e o Sub-16 do Al Hilil, um clube de Omdurman, um distrito de seu país. Depois disso, lá no Al-Ahly Al-Gadaref, ela enfim se tornou a primeira treinadora profissional do mundo árabe, o que não foi tão fácil assim, como recorda.
 
“No começo, alguns jogadores não colaboravam comigo só porque eu sou mulher. O futebol é meu primeiro e último amor. Há restrições para o futebol feminino, mas estou determinada a triunfar.” – Salma em entrevista para a Agence France-Presse.
 
Depois do primeiro feito profissional, ela trabalhou em outras equipes, de diferentes países, como citado acima. Mas além dos olhares tortos dos jogadores, ela enfrentou a desconfiança da própria família. Contudo, vivendo em um país onde a ONU classificou como “o que tem uma das situações mais espantosas do mundo”, ela enfrentou o pai e os tios para realizar seu sonho.

A invisibilidade do futebol feminino em países extremamente conservadores

Salma. Crédito: AFP/Ashraf Shazly
Jogadores escutam as instruções de Salma. Crédito: AFP/Ashraf Shazly

Incluída na lista das “100 mulheres inspiradoras” da BBC em 2015, Salma al-Majidi não foi a primeira a se meter no meio de um lugar tão machista. Mesmo sendo um dos fundadores da Confederação Africana de Futebol, o Sudão, fazendo fronteira com países como a Arábia Saudita, que tem uma das maiores desigualdades de gênero do mundo, acaba seguindo um pouco dessa linha. Mas nos anos 70, Mounira Ramadan também conseguiu reconhecimento apitando jogos do futebol masculino.

“O Sudão é um grupo de tribos e alguns deles acreditam que uma mulher deve ser confinada em casa. Havia um menino que se recusava a me ouvir. Ele me disse que pertencia a uma tribo quer acreditava que os homens nunca deveriam aceitar as ordens das mulheres”. – Salma al-Majidi.

Foram meses para Salma conquistar a confiança de seus jogadores, mas felizmente, o tempo lhe rendeu até referências carinhosas. “As pessoas na rua nos chamavam de Filhos da Salma“, lembra Majid Ahmed, atacante que jogou no time da treinadora. Um dos tios que criticavam a escolha da sobrinha acabou mudando de opinião ao assistir um jogo e ver a torcida gritando o nome dela.

Enfrentar uma cultura secular é de uma vontade e, mais do que tudo, de uma coragem gigantesca. Não é atoa que foi contemplada na lista da BBC entre as mulheres mais inspiradoras de 2015. Salma al-Majidi tem muito a nos ensinar, e já que se tornou uma inspiração, torceremos para que seja o início de uma mudança pelo menos no futebol árabe.

Daniel Dutra

Jornalista e fundador da PressFut. Também atua no SBT e na Rádio Tupi.
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