Brasil e Alemanha pela Copa de 2014. Crédito: Flávio Florido/UOL
Futebol, Futebol Nacional

Quem será o próximo culpado pela derrota do seu time?

Uma característica marcante do brasileiro é o individualismo. Presente no futebol desde cedo, essa característica vem fazendo o Brasil deixar de ser uma referência na modalidade. A cultura individualista de procurar um culpado após as derrotas é uma mentalidade amadora que não condiz com o esporte de alto rendimento.


Quantas vezes pegamos no pé de um jogador específico após uma derrota? Mas façamos um exercício. Essa tentativa de achar um culpado direto é justa, ou estamos tentando mascarar a nossa decepção? São perguntas muito fáceis de responder. Entretanto, difíceis de serem admitidas.

Uma das maiores derrotas da Seleção Brasileira, na Copa do Mundo de 1950, marcou para sempre a vida de um goleiro. A derrota na final para o Uruguai caiu no colo de Barbosa, que não parou a suposta bola defensável. As consequências do julgamento em cima de Barbosa foram grandes. Foram poucos os goleiros negros – como Barbosa – que voltaram a representar o Brasil, principalmente sendo titulares em Copas.

“A pena máxima por um crime no Brasil é 30 anos. Eu pago por aquele gol há 50.” – Barbosa, ex-goleiro da Seleção Brasileira.

É com esse individualismo que o Brasil observa as evoluções do futebol europeu. Até mesmo em termos táticos, o futebol brasileiro é um dos que ainda mantém em grande quantidade, a marcação individual (homem a homem), que hoje se mostra até ultrapassada e não é utilizada nos principais times do mundo.

Individualismo gera Imediatismo

Futebol brasileiro em busca de culpados.
Estudo mostra a diferença exorbitante da troca de técnicos entre o Brasil e as principais ligas.

Como bem sabemos, a vida útil do treinador brasileiro é bem curta. Em uma pesquisa realizada pelo Globo Esporte, trabalhando com os dados de 2011 até 2019, o número de técnicos que atuaram no Brasil chega a ser quase o triplo ao compararmos com os países em que houve mais troca. Em entrevista para a PressFut, Jair Ventura lembrou que o tempo médio do treinador brasileiro em uma equipe, é de apenas 3 meses.

“Eu vim de um trabalho com dois feitos inéditos, e de repente quando você vai para o Santos, as pessoas esperavam outros feitos inéditos. Mas não conseguimos, fizemos um trabalho regular. Classificamos em primeiro na Libertadores e quando eu sou demitido eu estava classificado nas oitavas. Não foi um trabalho tão curto, pois a média de trabalho de treinador no Brasil são 3 meses, e a gente ficou 7 meses. Mas faz parte, foi um aprendizado.” – Jair Ventura para a PressFut.

Assumir que um time não jogou bem o suficiente ou que o adversário foi melhor, é um desafio e tanto para o torcedor brasileiro. Não costumamos ser igual a torcida da Juventus que aplaude um gol de bicicleta que elimina sua equipe. Mas quando falamos de impaciência, nenhum time sofre mais do que as seleções.

Quem eliminou quem?

Fernandinho. Crédito: Manan Vatsyayana/AFP
Fernandinho foi decretado como o último culpado. Crédito: Manan Vatsyayana/AFP

Assim como Barbosa, outros jogadores sofreram ao longo dos anos. Roberto Carlos, Felipe Melo, David Luiz e Fernandinho foram os últimos principais. A resposta para as eliminações aparecem como um passe de mágica na atuação desses jogadores. Pelo menos é o que acham os torcedores comuns.

Tanto em 2014 como em 2018, Fernandinho carregou a culpa pelas eliminações brasileiras nas duas copas. Para muitos torcedores, ele não deveria nem ter sido chamado para a Copa do Mundo de 2018. Insinuaram que Tite estaria protegendo o jogador. Todavia, não há motivo para não convocá-lo. Fernandinho tem ótimos números e é um dos capitães do Manchester City, do aclamado Pep Guardiola, que tanto pedem na Seleção Brasileira. Então, com Guardiola no Brasil seria diferente? Não. Fernandinho chegou ali por competência.

E se os jogadores sofrem, os técnicos que comandam o país com mais trocas de treinadores também não passam batidos. Entretanto, a diferença entre treinar uma seleção e treinar um clube é muito grande, pois na seleção, não há tempo de treino e nem convívio com os atletas. Por isso, uma das estratégias usadas por Tite, é anunciar a convocação para os selecionados com quinze dias de antecedência. Assim, ele pode enviar por whatsapp, jogadas que serão colocadas em prática quando a equipe estiver junta em campo.

A incapacidade coletiva sempre procura um culpado

Quem foi o culpado? Crédito: Jamie McDonald/Getty Images
Procuram tanto um culpado que não analisam o problema coletivo. Crédito: Jamie McDonald/Getty Images

Nas peladas do dia a dia, sempre sobra para alguém que não marcou direito ou que não gritou ladrão. Contudo, ao falar do esporte profissional, precisamos entender que todos estão sendo analisados por equipes preparadas exclusivamente para isso. Profissionais que estudaram e anotam todas as informações pertinentes para avaliar um resultado e uma performance.

Por isso, não adianta reclamar que um jogador que é destaque em vários quesitos foi convocado. Além disso, é preciso levar em consideração os contextos. Nos clubes por exemplo, existe a questão financeira, que atrapalha a escolha por contratações. Não tem como reclamar de um jogador enquanto a gestão do clube está na justiça fazendo acordo para pagar dívidas. Da mesma forma, profissionais de preparação física são cobrados pelo número de lesões dos jogadores sem ao menos poder mostrar a estrutura que lhe é cedida para trabalhar.

Portanto, é preciso olhar para o todo. Não se pode julgar atleta A ou B por uma atuação ruim do coletivo. Esse imediatismo por resultados, junto com a incapacidade de reconhecer seus limites e o bom trabalho adversário, explica muito bem o fardo que muitos jogadores carregam ao longo da vida. Vale perceber ainda, que isso é um retrato da sociedade brasileira como um todo. Basicamente uma auto-sabotagem que afasta o Brasil do crescimento em paralelo com o resto do mundo.

Daniel Dutra

Jornalista e fundador da PressFut. Também atua no SBT e na Rádio Tupi.
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