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Um estudo da E&Y traçou um panorama sobre o tema clube-empresa nas 5 principais ligas europeias. A partir dele, podemos fazer uma reflexão.
Em janeiro de 2020, publiquei uma pequena sequência de matérias sobre: A Mordomia dos Cartolas Brasileiros, Clube-Empresa no Brasil e “Botafogo S/A”: o começo de uma era Gloriosa?. Um ano se passou e, com a pandemia do novo coronavírus, pouca coisa evoluiu. O projeto da Câmara dos Deputados ficou de lado diante da emergência mundial. Já o projeto de se tornar empresa do Botafogo, esfriou por conta de discussões e falta de confiança dos investidores.
Agora, completado um ano dessas matérias, vale fazer uma atualização do panorama dos clubes-empresas nas principais ligas e, para completar, mostrar o cenário regulatório também do Brasil. Para isso, utilizamos o estudo da Ernst & Young – citada nas outras matérias – do mês de dezembro de 2020 como base. Atualmente, 92% dos clubes da primeira e segunda divisão do Brasil são associações sem fins lucrativos. Por isso, alguns políticos correm contra o tempo para aplicarem o modelo de clube-empresa em nosso futebol.
Na primeira divisão das 5 principais ligas de futebol (Inglaterra, Alemanha, Itália, Espanha e França), 92% é o número de clube-empresas. Se incluirmos a segunda divisão desses respectivos países, o percentual de clubes empresas é de 96%. Contudo, cada liga teve sua particularidade. Inclusive, com modelos que inspiram o projeto da Câmara de Deputados do Brasil como: na Espanha, na França e na Itália, onde a transformação em clube-empresas ocorreu de forma obrigatória por meio de lei.
Panorama das Ligas Europeias
Como podemos ver na imagem acima, a grande maioria dos times das principais ligas são clube-empresas. Alguns poucos resistiram na Alemanha (14%) e na Espanha (10%).
Entre os cinco principais países do futebol, apenas a Inglaterra possui majoritariamente investidores estrangeiros. Já as demais ligas possuem em sua maioria, investidores nacionais. Normalmente, os proprietários nacionais são pessoas de forte vínculo com o clube que administram ou empresários da região. Nesse último caso, a Itália é um grande exemplo, com o grupo Agnelli comandando a Juventus e o Milan, que até pouco tempo era mais uma das empresas do todo poderoso Silvio Berlusconi.
Todavia, se tratando de investidores internacionais, dois países predominam: Estados Unidos e China são os maiores investidores fora dos países europeus, com 47% de participação nas ligas principais. Apenas a Alemanha não conta com o poder investido desses países. Na Espanha, ponto para a China (6%), na França, ponto para os Estados Unidos (10%).
Tipos de investidores
Como já citado anteriormente, existem diversos tipos de investidores. Pois vale lembrar, que clube-empresas são investimentos. Entre os principais tipos estão:
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Investidores tradicionais
Normalmente são fundos de investimento, mas também podem ser pessoas físicas que investem em setores da economia e querem diversificar esses investimentos e o retorno financeiro. Buscam um ativo de médio a longo prazo. Exemplo: Elliot Management Corp, donos do Milan.
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Mecenas Locais
Isso era o que a torcida do Botafogo esperava com os irmãos Moreira Salles. Pessoas físicas ou empresas com laços local, com o clube e sua história. Nesse caso, costuma ser mais um ato de apoio, pois não há tanta expectativa de retorno financeiro ou de publicidade. Por isso, o Itaú sempre esteve descartado como patrocinador do alvinegro. Exemplo: Fernando Roig, empresário espanhol dono do Villareal.
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Branding
Essa prática está se tornando cada vez mais comum. Através da visibilidade do esporte, algumas empresas buscam um espaço para fortalecer e expandir suas marcas. Exemplo: os 5 times da Red Bull espalhados pelo mundo.
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Cross Ownership
Esse modelo busca formar um grupo de times espalhados estrategicamente em diferentes países para fortalecer um único clube do grupo, conhecido como o principal. Com isso, conseguem trocar de jogadores e mantê-los sempre em atividade. Exemplo: City Football Group, dono do Manchester City e mais 6 clubes.
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GeoPolítico
Esse tipo merece cuidado. São investidores com motivações políticas gerando negócios e network com entidades públicas. Entretanto, já citamos em outras matérias que alguns ditadores usaram e usam a paixão pelo esporte, para aumentarem suas popularidades. Exemplo: Oryx Qatar Sports Investments, dono do PSG.
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Aficionados
Movidos pela paixão ou pelo desespero, torcedores se unem como acionistas minoritários, a famosa “vaquinha”. Exemplo: “Biris Norte”, “Accionistas Unidos SFC”, “Pequeños Accionistas” e a “Voz del Sevillismo”, acionistas do Sevilla.
Ambiente Regulatório
Sabendo que o Brasil ainda não obriga por meio de leis, a transformação dos clubes em empresas, a E&Y fez um comparativo do ambiente regulatório dos clubes associações em outros países que também não obrigam. A partir desse resumo, podemos ver que um dos principais fatores do amadorismo de nossas gestões está no tópico um. Diferente da Inglaterra e da Espanha, o Brasil e a Alemanha não responsabilizam os dirigentes por seus atos. Por isso, como citado na matéria sobre a “Mordomia dos cartolas brasileiros”, nossas gestões não possuem profissionais capacitados para os cargos e, a todo mandato, as dívidas crescem sem nenhuma responsabilidade fiscal.
Mas tudo isso pode mudar. Pois para os modelos de clube-empresas acontecerem, os países citados também precisaram trabalhar na regulamentação do futebol local. Todavia, também vale lembrar que existem clube-empresas no Brasil. Entre a primeira e segunda divisão, 3 clubes figuram na lista: RB Bragantino, Botafogo SP e Cuiabá. Mas como a legislação brasileira não determina a forma jurídica que os clubes devem adotar, eles optam por qualquer modelo previsto na legislação. Portanto, RB Bragantino e Cuiabá são Sociedades Empresárias Limitadas. Já o Botafogo SP, é uma Sociedade Anônima Fechada.
Ou seja, por mais que ainda não exista um projeto político em execução, a legislação oferece uma liberdade para que os clubes se tornem empresas. Por isso, o dirigente do Botafogo, Carlos Augusto Montenegro, sempre diz que não depende do projeto da Câmara dos Deputados. Ainda assim, uma maior regulamentação seria importante. Na imagem abaixo, um exemplo do crescimento das receitas das ligas com a evolução regulatória dos 5 principais países.
Requisitos e Restrições para clube-empresa
Ainda sobre o cenário regulatório, os países e ligas europeias estabelecem alguns requisitos diferentes em relação a propriedade dos clubes. Para isso, existem 4 tipos de restrições:
- Proprietários multi-clubes: Normalmente, proprietários únicos são proibidos de ter o controle de mais de um clube no país/liga. Em Portugal por exemplo, as restrições são mais brandas, limitando no percentual das ações dos times secundários. Já na Itália, funciona como no Carnaval brasileiro. É permitido desde que as equipes não concorram na mesma divisão. Exemplo: Napoli e Bari.
- Background Check: Desde 2004 a Premier League e a FA realizam o chamado – The Owners’ and Directors’ Test – que avaliam se um indivíduo poderá se tornar o proprietário ou diretor de um clube. Essa restrição é importante para barrar proprietários com condenações criminais, como no caso citado anteriormente sobre ditadores comprando clubes para tornarem-se mais populares. Exemplo: o ditador Mohammad Bin Salman foi proibido de comprar o Newcastle United.
- Limitações Acionárias: Na Bundesliga existe a Regra 50+1, que limita o controle dos clubes por investidores do mercado, mas além dela, para os campeonatos realizados pela UEFA, a entidade determina limitações quanto aos percentuais de ações e no desempenho de funções administrativas em equipes concorrentes nas competições participantes. Exemplo: Confrontos entre as equipes da Red Bull.
- Limites de Aportes Financeiros: “Tetos” também são estabelecidos por outras ligas, como a La Liga por exemplo. O aporte dos proprietários não pode ultrapassar 30% da receita total anual.
Ademais, existem outras restrições mais individuais dos países, que você pode ver diretamente na apresentação da E&Y.
Clube-empresa no Brasil
Entre o que será escrito nesse tópico, e o que foi escrito na última matéria sobre clube-empresa no Brasil, pouca coisa mudará. Os projetos seguem na mesma e, com interferência política, poucos investidores terão vontade de investir nos clubes brasileiros como o Botafogo por exemplo. Entretanto, novos cases ganham espaço. Para o próximo campeonato brasileiro, além do RB Bragantino, contaremos com o Cuiabá na primeira divisão.
Ainda assim, precisamos lembrar que clube-empresas não são a salvação de tudo. Pois acima de tudo, é preciso boas práticas de gestão, e por isso, regulamentações associativas como na Inglaterra e na Espanha são importantes. Podemos usar novamente o Botafogo como exemplo: prestes a cair para a segunda divisão, o clube possui uma das maiores dívidas do país e vê no projeto de clube-empresa, a única saída. Mas entre os privilégios das associações, está justamente, a quase impossível chance de falir. Clubes associativos não pagam impostos federais, IR e contribuição social. Ou seja, estão repletos de benefícios por supostas contribuições sociais.
Enquanto isso, do outro lado, clubes com a forma jurídica de empresas precisam recolher PIS/Cofins e o imposto de renda sobre o lucro de acordo com o regime escolhido. Portanto, não existe um modelo a se seguir. Por isso, a obrigatoriedade imposta na Espanha, na França e na Itália, não seja o melhor caminho, ainda que o mais rápido. É uma questão individual de cada clube, que, entretanto, com a profissionalização de uns, os outros acabam seguindo o mesmo caminho numa disputa de conquistas e profissionalização.